terça-feira, 19 de maio de 2009

CAP. 10 - FILOOFIA PRAGMATISTA

CAPÍTULO 10

FILOSOFIA PRAGMATISTA

Para muita gente, antes morrer que pensar e é isso mesmo que fazem (Bertrand Russel)

O termo “pragmatismo” tem sua origem no substantivo grego “pragma” que significa “prática”, termo que, na linguagem moderna do senso comum, tem o sentido de “intervenção na realidade física ou social”. Significado, portanto, diferente do que vamos encontrar na filosofia dialética.Como filosofia, o Pragmatismo é, sobretudo, tributário do Empirismo inglês, não deixando, de outra parte, de ser uma glosa do Realismo e do Idealismo, como acontece na sua concepção ontológica de que a realidade é fruto da interação entre o homem e a realidade. Dentro da linha ontológica, e a propósito da concepção de verdade, o Pragmatismo vai extremar o que já havia sido levantado pelos filósofos positivistas da Inglaterra, Bentham e Stuart Mill, de que verdade só se afirma como tal na ação: se depois da experiência (aqui, como sinônimo de experimentação), se notar que ela produziu resultados práticos e úteis, estamos então diante da verdade; caso contrário, não. Os neopragmatistas vão além e dizem que a verdade é uma experiência compartilhada. Exemplo: se estou, efetivamente, compartilhando de um almoço – isto é verdade; a mesa junto da qual me assento para almoçar – ela é uma verdade. O Pragmatismo floresceu viçosamente nos Estados Unidos no último quartel do século XIX. Seus principais arautos foram: Charles Pierce (1839-­1914), William James (1842-1910) e John Dewey (1859-1952). Nos dias atuais, seu grande paladino é o filósofo Richard Rorty e, mais perto de nós, o Prof. Larry, Diretor do Centro de Estudos Dewynianos nos Estados Unidos. Com Rorty, já se começa a falar em Neopragmatismo. Na década de trinta, houve, no Brasil uma tentativa pouco exitosa de introdução do pragmatismo no Brasil. Experiência realizada por Anísio Teixeira, que fora discípulo de Dewey nos Estados Unidos. Hoje, temos, em nosso País, uma vertente neopragmatista, capitaneada pela Prof. Paulo Ghirardelli Jr. e que recebeu forte impulso no Congresso Latino-americano de Filosofia da Educação, realizado, sob os auspícios da ABE, em homenagem ao centenário do nascimento de Anísio Teixeira, no Rio de Janeiro, em julho de 2000. O Pragmatismo é, na minha visão, uma filosofia existencialista, isto, por dois motivos: um, não admite uma natureza “a priori” do homem. Para ele, tudo parte do existente, ou melhor, parte da ação; dois, o pragmatismo não está preso ao passado e se serve do presente como alavanca do futuro. É uma filosofia, deveras, pro-ativa.
Trata-se de uma filosofia moderna, pois admite que o movimento é a substância (essência) da realidade e não uma incidência acidental. Entretanto, por não aproveitar a contribuição da filosofia dialética, considera o movimento num sentido mecanicista, ou seja: o movimento é linear e se dá mediante uma força externa. A Dialética, ao contrário, ensina que o movimento acontece devido a uma força interna, natural: a contradição.
Tendo uma ontologia indecisa e débil, o Pragmatismo é uma filosofia de vôo rasteiro, fôlego curto que, no entanto, tem conseguido manter a coesão da cultura e da nacionalidade norte-americana, quer antes, quer depois do “milagre econômico” acontecido nas primeiras décadas do século XX. É o decantado Way to life americano, uma época de abundância e consumismo desmedido.
Sendo John Dewey um dos mais importantes corifeus da filosofia pragmatista e um dos maiores expoentes da Pedagogia de todos os tempos, vamos ater-nos, neste ensaio, tão somente à exposição resumida da filosofia desse grande norte-americano:

A ontologia e a antropologia pragamatista
“A realidade é fruto da interação entre o homem e o meio”. Apesar de já ser uma filosofia moderna e existencialista, a ontologia do Pragamatismo é uma mistura de Idealismo e Realismo, pois ensina que a realidade é fruto da interação do homem com o meio; ela depende e não depende do homem.
“O homem é um ser biológico, vivendo em um mundo social” Ainda que bas-tante marcada pelo darvinismo e pela sociologia positivista, a antropologia pragmatista tem alguma originalidade, restringindo-se ao biológico e ao social. Verbalmente: “o homem é um ser biológico, vivendo em um mundo social”, ou “o homem é um ser biológico, em interação contínua com o ambiente”. A diferença entre o homem e o animal é somente de grau, e não de espécie. O homem é um animal mais aperfeiçoado. É capaz de agir, transformando a realidade para seu conforto pessoal. O Pragmatismo tem uma posição intei-ramente diferente das filosofias tradicionais em sua antropologia. Como se viu no item “antropologia do Pragmatismo”, não existe uma natureza humana a priori; “o homem se faz a si mesmo” pela contínua reconstrução da experiência no mundo. O homem é um ser plástico, pois está em constante mutação e adaptação.[1] Não é um ser transcendente, espiritual: ele se totaliza na dimensão bio-psicosocial. O Pragmatismo ensina que, se de um lado, o homem só se realiza na sociedade, de outro, afirma, entretanto: “não por causa da sociedade”. Sendo assim, a sociedade está a serviço do indivíduo; existe para ajudá-lo a resolver seus problemas e inserir-se como elemento útil na sociedade de produção e consumo.
No Positivismo, vimos que o indivíduo está a serviço da sociedade já que esta é a matriz do indivíduo. Ao contrário, a Filosofia Pragmatista vai ensinar que “O indivíduo é o embrião da sociedade”. Isto, não obstante o viés socialista de Dewey que defende o individualism, ao molde da cultura em que nasceu.
Diferentemente das filosofias estudadas, o homem não tem uma natureza - essência - a priori. A ação é a essência do homem: “Fora da atividade, não há explicação para o homem”. “O homem se faz a si mesmo, na ação”. “A essência do homem não está no intelecto, mas na ação”. Tudo, portanto, começa com a ação. O Pragmatismo absorve inteiramente a máxima de Goethe: “No começo era a ação”. Não é o intelecto o campo da eclosão do ser humano, como, de maneira geral, afirmam as filosofias estudadas; este campo é a própria prá-tica do ser humano.
O que se entende por ação no Pragmatismo? Evidentemente, não se trata da ação como um dos pólos num todo dialético, mas ação no sentido de qualquer intervenção na realidade individual (física) ou social, para transformá-la em algo útil ao conforto humano.
O homem não só faz a história, ele é a história viva”.
Quanto ao conceito de História, o Pragmatismo se distancia-se da concepção tradicional [2]que vê, na História, uma seqüência de fatos ocorridos linearmente no tempo, devido à influência de líderes religiosos ou políticos. O homem como que sofria a História, sendo dela somente seu objeto. O Pragma-tismo já começa a perceber que o homem é também sujeito da História - é seu construtor - e que esta, além da dimensão do passado, tem, por sua vez, a dimensão do presente, que é uma condição indispensável do futuro.

Gnosiologia e axiologia pragmatista
O Pragmatismo rejeita, claramente, a definição de conhecimento de Aristóteles: “adequação entre a mente e a realidade”. O conhecimento, para esta escola filosófica, não é o resultado da razão, mas a conclusão a que se chegou pela pesquisa científica. Para o contencioso “verdade”[3], o Pragmatismo diz que a verdade é uma experiência compartilhada ou, por outra, se a pesquisa chegou à conclusão de que seu resultado é útil, estamos diante da verdade. O Pragmatismo perfila a posição de Davi Hume, quando afirma que, além da percepção dos sentidos, nada existe, ou se existe, não pode ser conhecido (Kneller). O homem é produtor de conhecimento e não mero receptor. Pela primeira vez na História, é usada a expressão: “construir o conhecimen-to”. Ao contrário do Idealismo e do Realismo aristotélico e tomista, para os quais o conhecimento tinha uma finalidade imanente (em si mesmo), o Pragmatismo vai ensinar que o mesmo não tem finalidade em si. Sua finalidade é transeunte; não passa de um instrumento para manifestar a experiência, para manipular situações continuamente novas com que a mutabilidade da vida nos confronta. Para que o saber seja significativo, devemos saber o que devemos fazer com ele; por isso, ele deve estar unido à experiência (KNELLER, 1978 :. 63). Consultar também (SCHMITZ, 1980 :. 22-53).
Na axiologia e quanto ao aspecto das mudanças, os pragmáticos são coerentes com a posição assumida na ontologia e na antropologia. Tanto a realidade quanto o homem estão em contínua transformação de acordo com o tempo e o espaço. Sendo assim, os valores também mudam de acordo com o espaço e o tempo.
A ética pragmatista merece uma consideração à parte; acompanha a gnosiologia (o tratado do conhecimento). O Pragmatismo engrossa a onda anti-racionalista iniciada por Bentham e Stuart Mil e levada ao paroxismo com Kierkegaard[4]. Se o conhecimento chega ao que é útil, é verdadeiro. O que é útil é bom. O inútil é sempre mau. Útil é tudo que tráz conforto para o homem e o ajuda “a viver bem, a realizar atividades significativas para si próprio”, na expressão de Anísio Teixeira, o mais competente intérprete do Pragmatismo no Brasil. Útil é o que ajuda o homem a solucionar seus problemas pessoais e a cumprir bem sua função na sociedade.[5]

Crítica positiva ao pragmatismo
Como uma filosofia existencialista que é, o pragmatismo se insurge contra o apriorismo, o abstracionismo e o formalismo das filosofias anteriores, propondo que, antes de tudo, o ser humano tem que agir
Graças ao gênio de John Dewey, o pragmatismo deu um grande impulso à renovação da pedagogia que, colocando o estudante no centro do processo educativo, fez uma revolução copernicana na educação. Graças ao mesmo John Dewey, a democracia, apesar de difícil aplicação, tornou-se mais admissível, como vimos no cap. 02.

Crítica negativa à filosofia pragmatista
Uma crítica frontal. Nas entrelinhas, percebe-se que esta filosofia tem a finalidade de reforçar e perpetuar o prosaico individualismo norte-americano, agora com a marca registrada de “neoliberalismo” que não passa de uma pílula adocicada do capitalismo selvgem. O recurso ao social, como vimos, só tem uma finalidade: fazer crescer o individual, como pessoa e como nação. “O mundo só será feliz no dia em que a bandeira dos Estados Unidos for hasteada, uma no pólo norte, outra no pólo sul” (palavras de Taft - vigésimo presidente da Nação ianque).
Concluímos, pois, que o Pragmatismo, em que pesem os laivos socialistas de John Dewey, é uma filosofia que não incomoda a classe dominante e não se incomoda com classe dominada. Não se preocupa em formar cidadãos, mas tão somente insumos para o fomento do Nacionalismo xenófobo dos norte-ame-ricanos e do capitalismo selvagem (hoje neocapitalismo). Filosofia, portanto, extremamente ideológica e imprópria para responder às necessidades da autêntica e total natureza humana que deve preservar em nível de igualdade tanta a individualidade como a faceta social do ser humano.


[1] Segundo comentaristas atualizados da Teoria da Seleção Natural de Darwin, a concorrência ou competição não tem o sentido mercadológico, não passando do processo de adaptação das espécies.
[2] Não na concepção dialética que, mesmo inadvertidamente, toda filosofia endossa.
[3] Sobre o dito contencioso da verdade, o neopragmatista Rorty diz que nem a filosofia, nem a ci_
ência é capaz de chegar à verdade do objeto, visto ser ela espacial e temporal.
[4] Kierkegaard (1813-1855) lançou as bases da filosofia existencialista,
[5] Ver no cap. I a diferença entre “útil externo” e “útil interno”.

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